sábado, 11 de agosto de 2018

Leituras do mês: julho

O hábito da escrita é um hábito muito fácil de se perder. Não completamente, é claro. Mas manter um blog e fazer resenhas frequentes é difícil, ainda mais quando quase ninguém mais se interessa por resenhas em texto. Tinha uma época em que eu conseguia resenhar praticamente tudo o que lia, mas de repente meu ritmo de leitura atropelou o ritmo de escrita e só fui acrescentando nomes de livros para resenhar em uma lista infinita. E cada vez que olhava para a lista eu ficava mais desanimada e tinha menos vontade de escrever. Resisti por um tempo, com uma resenha aqui e outra acolá, se as leituras realmente me diziam algo, mas tem uma hora que você precisa admitir que não dá mais. E só assim podemos começar de novo.

Então é isso: não vou mais escrever resenhas, a não ser que os livros realmente me tragam muita inspiração para escrever. Em vez disso, vou comentar mensalmente minhas leituras, em um formato curto e grosso. Se isso vai durar eu também não sei, mas vamos tentar, né?

1- Sonhos que ganhei, Solaine Chioro
Alguns autores brasileiros vêm lançando bastante coisa de forma independente na Amazon, com preços baixos e às vezes gratuitos. Em geral são contos ou coletâneas, como é o caso desse. Sonhos que ganhei é uma reunião de histórias natalinas que se passam na mesma cidade — por isso alguns personagens aparecem em mais de um conto. Não sou a mais fanática pelo espírito natalino, mas as histórias são bonitinhas e fáceis de ler. No entanto, achei o conto final, o próprio "Sonhos que ganhei", um pouco forçado no drama pré-redenção natalina, se é que vocês me entendem. Avaliação: 3/5

2- O vilarejo, Raphael Montes
Minha primeira experiência com a obra de Raphael Montes foi este curto livro de contos, cada um com a temática de um dos sete pecados capitais. São histórias sombrias que se passam no mesmo vilarejo e portanto alguns personagens aparecem em mais de um conto (juro que a escolha dele após Sonhos que ganhei foi coincidência!). Essa conexão é o aspecto mais interessante do livro, visto que os contos são muito curtos para desenvolver algo mais complexo. Existe um clima de terror, mas a falta de espaço para desenvolvimento impede que o livro seja verdadeiramente assustador. Não me empolgou por completo, mas ainda tenho curiosidade em conhecer o resto dos livros do autor. Avaliação: 3/5 

3- Fever pitch, Nick Hornby
A Copa do Mundo é o único momento em que me importo com futebol, portanto foi o período ideal para ler a obra de Hornby sobre o esporte. Ele nos conta sobre sua relação com o time Arsenal e sobre como tudo à sua volta acaba sendo impactado pela sua obsessão futebolística. É uma leitura interessante para quem também é fanático por algum esporte — no meu caso, patinação —, mas também é um pouco cansativo para quem não liga para a história do Arsenal, já que há algumas descrições de jogos. Avaliação: 3/5

3- Mary Poppins, P.L. Travers
Sou uma pessoa que normalmente gosta de literatura infantil. Existem escritores que conseguem transmitir a ingenuidade do mundo das crianças com facilidade para as suas páginas, criando histórias divertidas para todos. Mas às vezes alguns livros não conversam tão facilmente com a gente. Foi o caso de Mary Poppins. Eu não assisti ao filme clássico da Disney para poder comparar e para ter a sensação de nostalgia, então a história da babá mágica era completamente nova para mim. Nova e entediante, para ser sincera. Mary Poppins é uma babá rígida e rude no livro e a magia que ela traz pode fascinar as crianças, mas não me encantou. Cada capítulo do livro conta um causo diferente, e o meu favorito foi o focado nos bebês da família, que cria uma história bonitinha para explicar o mundo deles — eles conseguem se comunicar com o resto do mundo, como com passarinhos (mas não com humanos crescidos), e perdem essa capacidade ao crescer e se integrar melhor em sociedade. Não sei se seria um livro que me animaria quando criança também, porque talvez seja questão de estilo mesmo: é uma literatura infantil bem clássica, centrada na mágica pura e simples de voar, conversar com animais e coisas assim, e talvez isso não anime tanto quem cresceu com Harry Potter. Mas a edição da Cosac Naify é bela. Avaliação: 2,5/5

4- Gen - pés descalços, volume 3: trigo, é hora de brotar, Keiji Nakazawa
Nesse volume, continuamos acompanhando os sofrimentos de Gen, sobrevivente da bomba atômica, para conseguir dinheiro. Ele tem dificuldades de achar trabalho e quase não encontra solidariedade entre os outros sobreviventes, egoístas e preocupados apenas com a própria sobrevivência. Ler os mangás de Gen não é fácil; é uma leitura crua e angustiante, que nunca nos deixa esquecer das violências da guerra. É um pouco cansativo ver Gen constantemente conseguindo alguma coisa (dinheiro, comida) e depois a perdendo por ele ser bondoso ou pelos outros o roubarem, mas faz parte da repetição da vida. Avaliação: 3,5/5

5- Everything I never told you, Celeste Ng
Celeste Ng é uma autora tão bem comentada na minha bolha internética que eu fiquei com medo das expectativas estragarem minha leitura. Não foi o que aconteceu. Fui emocionalmente capturada pela história da família Lee. A autora conseguiu criar personagens críveis e também construir bem a narrativa de forma que o leitor vai entendendo aos poucos as motivações de cada personagem. No início eu estava achando a história um pouco esquemática demais — a mãe, que é branca e sofre com o machismo, quer se destacar de todos, enquanto o pai, que sofre racismo por ser descendente de chineses, quer apenas ser visto como mais um na multidão, um americano comum como ele de fato é —, mas com o tempo consegui entrar na mente dos personagens, embora o destaque ainda fique com os filhos, na minha opinião. Everything I never told you é um drama familiar que me fisgou e conversou comigo como poucos livros fizeram recentemente, e agora estou curiosíssima para ler Pequenos incêndios por toda parte. Avaliação: 5/5
 
6- Isto não é um livro de Matemática, André Caniato
Outro continho que baixei gratuitamente na Amazon e minha primeira experiência negativa com o que eu chamo de "leituras de ponto de ônibus". A questão é que o formato desse conto não me prendeu — o protagonista e narrador usa seu caderno de matemática como diário durante as aulas — e não consegui criar empatia com nenhum personagem. Além disso, a descrição do interesse amoroso como japonês, esclarecendo depois que a fotografia que ele usava em um site era real, mas que o protagonista achou que fosse de um ator porque "ele não era como todos os outros", me soou bem racista e ofensiva. Não sei se tem outra maneira de interpretar isso, mas não nego que fiquei com raiva. A sacadinha final é fofa e é o aspecto mais interessante do livro. Avaliação: 2/5