quinta-feira, 11 de outubro de 2018

Os (realmente não tão) últimos filmes que eu vi #23

1- The hunting ground (Kirby Dick, 2015)
O documentário discute a questão dos estupros nas universidades americanas. Eu o assisti na época do estupro coletivo de uma jovem carioca e é um filme muito importante para quem acha que só país de terceiro mundo sofre com a cultura de estupro ou que a impunidade só ocorre no Brasil. É doloroso ver quanto os abusos sexuais são comuns e como as autoridades evitam criminalizá-los, abafando o casos, para que as universidades não fiquem com má fama. O formato do documentário é bem tradicional, com entrevista com sobreviventes, psicólogos e autoridades. Para quem não vê muito do gênero, como eu, pode ser um pouco cansativo, mas vale a pena para quem quer se informar e, em decorrência disso, sofrer com o machismo do mundo. E é triste também pensar que embora de forma diferente, visto que a estrutura universitária brasileira não é igual à americana, muita coisa se aplica ao Brasil: não temos fraternidades nem ídolos do esporte universitário, mas temos atléticas e festas e o mesmo medo de manchar instituições de renome. Avaliação: 3,5/5

2- Blow-up: depois daquele beijo (Michelangelo Antonioni, 1966)
Vi um pedaço desse filme na escola, enquanto a gente aprendia sobre metalinguagem(?), e fiquei protelando por séculos para assisti-lo inteiro. A sinopse parece a de um filme de mistério: um homem descobre um homem morto ao ampliar uma fotografia que tirou. Mas é um filme de arte, e muita coisa parece não fazer sentido ou é simbólica, e eu honestamente não entendi muito bem. Ainda assim, foi uma experiência interessante, porque é um filme bem diferente do que estou acostumada a ver. Avaliação:3,5/5

3- Jogos vorazes: em chamas (Francis Lawrence, 2013)
Não gostei especialmente do filme de Jogos vorazes, por isso demorei tanto para ver a continuação. Mas, como muita gente já tinha dito, Em chamas é superior ao primeiro filme, e me fez voltar a sentir aquele mal-estar típico de distopias que o livro me trouxe em alguns momentos. Fiquei angustiada no começo do filme e gosto do fato de metade da história se passar fora da arena — não que isso seja mérito do filme, mas enfim. A curiosidade para ver as sequências ficou aguçada. Avaliação: 4/5

4- Os excêntricos Tenenbaums (Wes Anderson, 2001)
Esse é o quinto filme do diretor que eu vejo e é também um dos mais famosos. Como o título sugere, o filme conta a história da família Tenenbaum, que tem personagens excêntricos — como esperado de uma obra de Wes Anderson. O filme prende a atenção, é esteticamente agradável de ver e todos os membros da família são interessantes, mas sinto falta de algo que dê sentido ao filme e que eu possa compreender. Não sinto que eu entendo de verdade a proposta do cinema do diretor, apesar de normalmente aproveitar os filmes dele. Avaliação: 3,5/5

5- Growing up and other lies (Darren Grodsky e Danny Jacobs, 2014)
Às vezes a gente coloca filmes na lista da Netflix só porque a descrição parece interessante, sem termos nenhuma referência. E quando não dá vontade de ver nenhum filme conhecido da lista, sobram esses filmes: já que não há expectativa, não há como vê-los no momento errado, não é? Esse filme foca em um grupo de amigos formado por homens héteros (é importante ressaltar) que se conheceram na faculdade. Quando um deles decide se mudar para outra cidade para morar com o pai, eles se reúnem de novo para andar pro Nova York e o convencer a ficar lá. Sinceramente, é um filme bem qualquer coisa. Todos os personagens são um pé no saco e é um filme bem hétero mesmo, no estilo moderninho hipster nova iorquino. Não considero que tenha sido um desperdício do meu tempo, mas não recomendo. Às vezes existe um motivo para alguns filmes não serem tão conhecidos mesmo. Avaliação: 2,5/5

6- Para sempre Alice (Richard Glatzer e Wash Westmoreland, 2014)
Vi o filme só porque ele ia sair do catálogo da Netflix, o que significa que a distância entre eu ter lido o livro e visto o filme foi menor do que eu gostaria. No geral, é uma adaptação relativamente fiel, que muda detalhes e mantém o essencial. Achei que ia me emocionar bem mais vendo a história do que lendo, mas, talvez por já saber o que acontecia, talvez porque eu sabia claramente que o filme é de ficção, isso não aconteceu. Por ser mais rápido, recomendaria ver o filme em vez de ler o livro, mas para mim não é um filme indispensável. Avaliação: 3/5

 7- Casa grande (Fellipe Barbosa, 2014)
O filme estava em cartaz mais ou menos na mesma época que Que horas ela volta? e vi várias comparações entre os dois, porque eles abordam a mesma temática. A diferença é que enquanto o filme da Anna Muylaert foca na vida da empregada, Casa grande, como indica o título, retrata os patrões. O filme acompanha a vida de Jean, jovem filho da casa grande que está em colapso mas tenta esconder isso. Os pais dele, com claros problemas financeiros, tentam manter a sua posição social enquanto o filho vai descobrindo quem ele é. Casa grande discute bem a questão dos privilégios e desigualdades, embora às vezes opte por um caminho explícito demais, como na discussão escolar sobre cotas. No geral, achei interessante, mas não me conquistou por completo. Avaliação: 3,5/5

8- Qual seu número? (Mark Mylod, 2011)
Tinha uma época em que assistia a comédias românticas frequentemente. Eu ainda vejo bastante, mas em geral são filmes adolescentes ou com cara de independentes, fazia muito tempo que não via uma comédia romântica hollywoodiana bem padrão. E honestamente podia ter passado mais tempo sem ver essa. A premissa é interessante: a personagem de Anna Faris lê em uma revista algumas estatísticas sobre quantos parceiros a mulher média já teve e fica chocada com o número. Para não aumentar sua própria contagem e dessa forma diminuir a chance de se casar, ela decide fazer sua lista e reencontrar seus ex-namorados, pois vai que algum deles era mesmo o amor da sua vida? A sua busca pelos ex é feita ao lado do vizinho galinha interpretado por Chris Evans, e acho que todo mundo sabe o que vai acontecer a partir daí. Não faço a menor ideia do que eu estava esperando quando fui ver o filme, porque ele entrega exatamente o que promete, mas eu fiquei tão frustrada. É tudo tão óbvio, tão sem graça. Eu gostei da Anna Faris em A casa das coelhinhas (sério), mas a personagem dela aqui é sem sal. E não ligo para o Chris Evans, desculpa, sociedade. Enfim, não gostei. Avaliação: 2/5

9- Rubber (Quentin Dupieux, 2010)
Às vezes a vida nos dá coisas maravilhosas, como um filme sobre um pneu assassino com poderes telecinéticos. Parece trash, e é trash, mas há uma filosofia por trás: a de que as coisas acontecem por nenhum motivo. Se a vida não faz sentido, por que um filme precisa fazer? Como minha irmã já tinha visto o filme antes, já sabia que ele não seria tão ruim, o que acaba um pouco com o impacto de esperar algo e se deparar com outra coisa, completamente diferente. Mesmo assim, a metalinguagem me surpreendeu logo no início, quando aparecem os espectadores aguardando para ver Rubber. O filme sabe que não há como ele ser realista, então ele brinca com isso desde o início. Para quem não assiste tanta coisa estranha, foi uma bela surpresa. Avaliação: 3,5/5

10- A garota de fogo (Carlos Vermut, 2014)
Fiquei interessada pelo filme pelo seu título original: Magical girl. Mas, diferente do que esse nome indica, a história não é bem sobre uma garota mágica que luta pelo amor e a justiça. A tal garota não é mágica, mas gostaria de se tornar a Magical Girl Yuriko, e como está doente seu pai sente a necessidade de cumprir todos seus desejos, mesmo que para isso precise de métodos escusos. O foco da trama é mais no pai e no que ele fará, além de termos outros personagens que parecem perdidos no início mas depois vão se encaixando no enredo.O filme é um drama misturado com suspense que me deixou com um gosto amargo na boca. Me lembrou um pouco a obra de Almodóvar, mas o fato de ambos diretores serem espanhóis deve ter influenciado na minha comparação. Uma pena que o filme teve pouco espaço aqui, passando somente em mostras. Avaliação: 4/5

quarta-feira, 19 de setembro de 2018

Top 10 perfomances favoritas da temporada: masculino

A temporada 2018-2019 já começou, mas ainda dá tempo para rememorar a temporada olímpica, né? Fiz uma lista das minhas dez performances favoritas de cada categoria para não esquecer daquilo de que mais gostei. A lista está mais ou menos em ordem (ou seja, é certo que gosto mais do primeiro do que do décimo, mas não tão certo que prefiro o sétimo ao oitavo) e mistura programas, performances ou momentos memoráveis dessa temporada tão dramática que vivemos. É claro que sou tendenciosa e tenho minhas preferências de patinadores e de tipos de programas, e é uma lista extremamente pessoal. Evitei de propósito algumas performances olímpicas que não tinham vídeo fácil de achar, e nem todas as performances escolhidas são as que fizeram mais pontos, às vezes optei por aquilo que mais me marcou por estar acompanhando a competição ao vivo (por streaming, infelizmente). Não sei quando vou postar as outras categorias, mas espero terminar essas listas antes da temporada 2019-2020 começar, quem sabe...

(fonte)
10. Mikhail Kolyada (programa curto na Cup of China)
Às vezes as coisas dão certo e Kolyada consegue fazer um belo quádruplo lutz e aterrissar com segurança. É um fenômeno raro, muito raro, e por isso é tão especial. Kolyada é um patinador que tem tudo para ser um sucesso, mas que sofre com a inconsistência e com os programas não muito bons na questão artística. Mas eu sinceramente gosto desse programa curto, que inicia com o Piano Concerto nº. 23 de Mozart e de repente passa para um tango, mostrando bem as qualidades clássicas do patinador russo.

(fonte)
9. Keiji Tanaka (programa curto na Cup of China)
Keiji é um dos patinadores por quem você acaba simpatizando mais pela quantidade de coisas que se vê sobre ele fora do gelo (ele gosta de fazer tarefas domésticas! Ele gosta de anime! Ele parece um ser humano muito responsável em comparação com Yuzuru e Shoma!) do que pela patinação em si. Conhecido pela sua inconsistência e pelos pops, ele teve uma boa temporada em 2017/2018, indo para as Olimpíadas e fazendo programas curtos limpos pelo menos duas vezes. Esse programa, ao som de da guitarra de Gary Moore, combina com o estilo do Keiji, especialmente se apresentado com a confiança que vemos aqui.
Quase que Kazuki não teve a chance de fazer as performances da sua vida até agora. Como segundo substituto no mundial, Kazuki foi acionado devido ao machado de Yuzuru e à aposentadoria de Mura. Sabendo que era sua chance de brilhar, e com a pressão de precisar de uma boa colocação para garantir as três vagas do Japão para o próximo mundial, ele fez mais do que quase todos esperávamos com um programa curto limpo e um longo sem quedas. Em uma competição marcada pelo desastre e por inúmeras quedas, Kazuki levou de brinde uma medalha pequena de bronze pelo programa longo e um incrível quinto lugar no seu primeiro mundial. O programa de West Side Story aproveita bem os pontos positivos dele: a qualidade performática e a óbvia alegria que apresenta ao patinar. E isso é só o começo para ele.

(fonte)
7. Dmitri Aliev (programa longo no campeonato europeu) 
Dizem que a esperança é a última que morre, e quando Dmitri Aliev, contra todas as expectativas, fez essa performance, a esperança continuou viva, muito bem, obrigada. Último homem a se apresentar no Europeu, Aliev tinha uma tarefa simples: ir melhor que Samarin para garantir sua vaga olímpica. Mas a sua fama de desastroso em programas longos era grande demais para os corações dramáticos de fãs, que insistiam que sua condição física nunca era suficiente para ele terminar os programas sem parecer que ia desmaiar. Aliev provou que não, não faltava energia coisa nenhuma (ou talvez só um pouquinho...), superando até Kolyada para ficar com a medalha de prata no seu primeiro campeonato europeu, ao som de To build a home e da trilha sonora de Pequena Miss Sunshine
Yuzuru é o patinador mais famoso e mais bem-sucedido atualmente. Com um séquito de fãs, ele é o favorito de pelo menos metade do fandom do esporte. E isso cria um sentimento estranho em quem não gosta dele tanto assim. Afinal, depois de ouvir repetidamente que tudo que ele faz é uma obra-prima, é um pouco chato não conseguir sentir isso de verdade. Racionalmente, sei que ele é o patinador do masculino mais completo; emocionalmente, nem sempre consigo me conectar com as performances dele. O que importa é que esse programa, ao som de Ballade nº. 1 do Chopin, tem belos momentos, e se eu não coloco em uma posição mais alta é porque, bom, é a terceira temporada que Yuzuru o usa e nós queremos novidades. 
Patrick Chan é um gosto adquirido. Ele dominou as competições por um tempo, com pontuações altíssimas em performances com erros, sendo odiado por muitos, até que deu uma pausa na carreira e voltou uma temporada depois. Mais maduro e sem vencer tanto, logo a opinião popular mudou: Patrick é sim um dos melhores patinadores. Conhecido pelas skating skills maravilhosas e incomparáveis (note como ele parece patinar sem fazer esforço nenhum), ele teve sua última temporada competitiva um tanto atribulada, sofrendo por falta de motivação. Aqui, no entanto, com seu programa ao som de Dust in the wind no início da temporada, a gente ainda não sabia de nada e podia aproveitar a patinação de Patrick pelo simples prazer que é assisti-lo.

(fonte - finja que o gif é do Quatro Continentes)
 4. Shoma Uno (programa curto no Quatro Continentes)
Se minha relação com o Yuzuru é complicada, a com o Shoma é mais ainda. Foi ele que me fez voltar a acompanhar o esporte, mas na temporada olímpica seus programas foram escolhas decepcionantes: Inverno, do Vivaldi, uma música batidíssima para o programa curto, e Turandot, outra música batidíssima e ainda reprise do programa de 2015/2016, para o longo. Mas com o tempo eu aprendi a gostar do programa curto do Shoma, conforme ele foi se sentindo mais a vontade com a coreografia. Se o segredo de apreciar alguns patinadores, como Yuzuru e Patrick, é focar no que eles fazem com os pés, para Shoma a recomendação é o contrário: não veja os pés e foque na parte superior do corpo. Ele tem um controle nos braços que é difícil de ver em outros patinadores e isso me faz ignorar o fato de que ele passa boa parte do programa com os dois pés no gelo fazendo crossovers.

(fonte)
 3. Nathan Chen (programa curto na Rostelecom Cup) 
Esse programa foi uma surpresa muito boa. A maioria dos patinadores, especialmente os mais competitivos, faz escolhas musicais seguras e pouco inventivas, mas Nathan quis uma música contemporânea com uma coreografia mais inovadora (ou no mínimo menos esquecível). O programa foi perdendo um pouco da graça conforme a temporada foi passando, mas na Rostelecom Cup ainda era novidade, e também foi a melhor performance em termos de estilo: com os cachos e a roupa simples em vez da minimalista feita pela Vera Wang que ele usou nas Olimpíadas.

(fonte)
 2. Keegan Messing (programa curto no campeonato mundial)
Eu não sabia da existência de Keegan Messing antes da temporada começar, mas ele logo me conquistou. Normalmente não gosto muito de programas tipo showman clássico, mas abro exceções para quem combina com o estilo. E o Keegan certamente combina. Ele pode ser um pouco bagunçado às vezes, mas quando faz um programa limpo tudo se encaixa. A coreografia desse programa ao som de Singin' in the rain ressalta seus os pontos fortes, e no geral o considero um patinador bem completo: boas skating skills, saltos grandes quando ele os acerta e spins rápidos, lembrando o estilo clássico norte-americano de patinação.

(fonte)
 1. Adam Rippon (programa longo no NHK Trophy)
Quando voltei a acompanhar o esporte, o Adam estava machucado, por isso eu não conhecia ainda os seus programas. Por mais que normalmente eu seja contra repetições, nesse caso achei que foi uma boa escolha. Seria difícil superar o programa curto da temporada anterior, com a música eletrônica, mostrando seu lado divertido e atrevido, e o longo contemporâneo e mais sério, ao som de Arrival of the birds, do The Cinematic Orchestra, e O do Coldplay. Adam não é o patinador mais técnico do mundo; seus saltos não são os mais difíceis e suas skating skills poderiam ser melhores. Mas ele é excelente na parte da performance, e quando se acorda cedo em um fim de semana para assistir ao NHK Trophy, após todos os desastres e machucados de outros patinadores durante a temporada, tudo que eu preciso é de um programa belo e praticamente limpo, além de um patinador obviamente muito feliz e orgulhoso do que fez, para me lembrar do motivo pelo qual eu vejo patinação.

sábado, 11 de agosto de 2018

Leituras do mês: julho

O hábito da escrita é um hábito muito fácil de se perder. Não completamente, é claro. Mas manter um blog e fazer resenhas frequentes é difícil, ainda mais quando quase ninguém mais se interessa por resenhas em texto. Tinha uma época em que eu conseguia resenhar praticamente tudo o que lia, mas de repente meu ritmo de leitura atropelou o ritmo de escrita e só fui acrescentando nomes de livros para resenhar em uma lista infinita. E cada vez que olhava para a lista eu ficava mais desanimada e tinha menos vontade de escrever. Resisti por um tempo, com uma resenha aqui e outra acolá, se as leituras realmente me diziam algo, mas tem uma hora que você precisa admitir que não dá mais. E só assim podemos começar de novo.

Então é isso: não vou mais escrever resenhas, a não ser que os livros realmente me tragam muita inspiração para escrever. Em vez disso, vou comentar mensalmente minhas leituras, em um formato curto e grosso. Se isso vai durar eu também não sei, mas vamos tentar, né?

1- Sonhos que ganhei, Solaine Chioro
Alguns autores brasileiros vêm lançando bastante coisa de forma independente na Amazon, com preços baixos e às vezes gratuitos. Em geral são contos ou coletâneas, como é o caso desse. Sonhos que ganhei é uma reunião de histórias natalinas que se passam na mesma cidade — por isso alguns personagens aparecem em mais de um conto. Não sou a mais fanática pelo espírito natalino, mas as histórias são bonitinhas e fáceis de ler. No entanto, achei o conto final, o próprio "Sonhos que ganhei", um pouco forçado no drama pré-redenção natalina, se é que vocês me entendem. Avaliação: 3/5

2- O vilarejo, Raphael Montes
Minha primeira experiência com a obra de Raphael Montes foi este curto livro de contos, cada um com a temática de um dos sete pecados capitais. São histórias sombrias que se passam no mesmo vilarejo e portanto alguns personagens aparecem em mais de um conto (juro que a escolha dele após Sonhos que ganhei foi coincidência!). Essa conexão é o aspecto mais interessante do livro, visto que os contos são muito curtos para desenvolver algo mais complexo. Existe um clima de terror, mas a falta de espaço para desenvolvimento impede que o livro seja verdadeiramente assustador. Não me empolgou por completo, mas ainda tenho curiosidade em conhecer o resto dos livros do autor. Avaliação: 3/5 

3- Fever pitch, Nick Hornby
A Copa do Mundo é o único momento em que me importo com futebol, portanto foi o período ideal para ler a obra de Hornby sobre o esporte. Ele nos conta sobre sua relação com o time Arsenal e sobre como tudo à sua volta acaba sendo impactado pela sua obsessão futebolística. É uma leitura interessante para quem também é fanático por algum esporte — no meu caso, patinação —, mas também é um pouco cansativo para quem não liga para a história do Arsenal, já que há algumas descrições de jogos. Avaliação: 3/5

3- Mary Poppins, P.L. Travers
Sou uma pessoa que normalmente gosta de literatura infantil. Existem escritores que conseguem transmitir a ingenuidade do mundo das crianças com facilidade para as suas páginas, criando histórias divertidas para todos. Mas às vezes alguns livros não conversam tão facilmente com a gente. Foi o caso de Mary Poppins. Eu não assisti ao filme clássico da Disney para poder comparar e para ter a sensação de nostalgia, então a história da babá mágica era completamente nova para mim. Nova e entediante, para ser sincera. Mary Poppins é uma babá rígida e rude no livro e a magia que ela traz pode fascinar as crianças, mas não me encantou. Cada capítulo do livro conta um causo diferente, e o meu favorito foi o focado nos bebês da família, que cria uma história bonitinha para explicar o mundo deles — eles conseguem se comunicar com o resto do mundo, como com passarinhos (mas não com humanos crescidos), e perdem essa capacidade ao crescer e se integrar melhor em sociedade. Não sei se seria um livro que me animaria quando criança também, porque talvez seja questão de estilo mesmo: é uma literatura infantil bem clássica, centrada na mágica pura e simples de voar, conversar com animais e coisas assim, e talvez isso não anime tanto quem cresceu com Harry Potter. Mas a edição da Cosac Naify é bela. Avaliação: 2,5/5

4- Gen - pés descalços, volume 3: trigo, é hora de brotar, Keiji Nakazawa
Nesse volume, continuamos acompanhando os sofrimentos de Gen, sobrevivente da bomba atômica, para conseguir dinheiro. Ele tem dificuldades de achar trabalho e quase não encontra solidariedade entre os outros sobreviventes, egoístas e preocupados apenas com a própria sobrevivência. Ler os mangás de Gen não é fácil; é uma leitura crua e angustiante, que nunca nos deixa esquecer das violências da guerra. É um pouco cansativo ver Gen constantemente conseguindo alguma coisa (dinheiro, comida) e depois a perdendo por ele ser bondoso ou pelos outros o roubarem, mas faz parte da repetição da vida. Avaliação: 3,5/5

5- Everything I never told you, Celeste Ng
Celeste Ng é uma autora tão bem comentada na minha bolha internética que eu fiquei com medo das expectativas estragarem minha leitura. Não foi o que aconteceu. Fui emocionalmente capturada pela história da família Lee. A autora conseguiu criar personagens críveis e também construir bem a narrativa de forma que o leitor vai entendendo aos poucos as motivações de cada personagem. No início eu estava achando a história um pouco esquemática demais — a mãe, que é branca e sofre com o machismo, quer se destacar de todos, enquanto o pai, que sofre racismo por ser descendente de chineses, quer apenas ser visto como mais um na multidão, um americano comum como ele de fato é —, mas com o tempo consegui entrar na mente dos personagens, embora o destaque ainda fique com os filhos, na minha opinião. Everything I never told you é um drama familiar que me fisgou e conversou comigo como poucos livros fizeram recentemente, e agora estou curiosíssima para ler Pequenos incêndios por toda parte. Avaliação: 5/5
 
6- Isto não é um livro de Matemática, André Caniato
Outro continho que baixei gratuitamente na Amazon e minha primeira experiência negativa com o que eu chamo de "leituras de ponto de ônibus". A questão é que o formato desse conto não me prendeu — o protagonista e narrador usa seu caderno de matemática como diário durante as aulas — e não consegui criar empatia com nenhum personagem. Além disso, a descrição do interesse amoroso como japonês, esclarecendo depois que a fotografia que ele usava em um site era real, mas que o protagonista achou que fosse de um ator porque "ele não era como todos os outros", me soou bem racista e ofensiva. Não sei se tem outra maneira de interpretar isso, mas não nego que fiquei com raiva. A sacadinha final é fofa e é o aspecto mais interessante do livro. Avaliação: 2/5

sexta-feira, 27 de julho de 2018

Patinação: questões para o próximo ciclo olímpico

Vivemos intensamente a temporada olímpica de 2017/2018 e estamos prestes a começar um novo ciclo olímpico. Já aconteceram muitas coisas no mundo da patinação nessa off season, do retorno de Daisuke Takahashi às milhares de separações de times de pares e dança. A tragédia da morte de Denis Ten, no entanto, coloca essas notícias no escanteio. Voltaremos a uma nova temporada um tanto abalados, mas também com esperança de que coisas melhores virão.

Escrevi essas questões antes de tudo isso acontecer. São perguntas que estavam na minha mente sobre o futuro da patinação, e acho legal colocá-las no blog para poder acompanhar suas respostas no futuro.

- As garotas treinadas pela Eteri continuarão dominando a categoria junior? Trusova conseguirá saltar seus quádruplos novamente? No geral, as meninas do junior, que parecem prometer uma revolução técnica, vão de fato fazer isso ou os triple axels e quádruplos são apenas para se exibir na redes sociais, e competições são para elementos mais seguros?

- O desastre de Zagitova no mundial foi pontual ou será o início do fim para ela? A mudança de técnico da Medvedeva dará a longevidade pretendida para ela? E, mais importante, tornará a patinação e os programas dela mais agradáveis?

- O masculino continuará sofrendo com as lesões de múltiplos atletas? Os programas com alta dificuldade técnica, vulgo enorme quantidade de quádruplos, se manterão como norma necessária para ganhar mesmo com as mudanças nas regras?

- A mudança nas regras será boa ou ruim? Ela tornará o esporte mais chato de assistir? Haverá mais alterações significativas no esporte?

- Haverá espaço para alguém de federação pequena ganhar competições importantes? Alguma federação grande dominará todas as categorias? Existe a possibilidade de termos um pódio que não contenha Canadá, Rússia e Estados Unidos na competição por equipes em 2022?

- Sairá algo de bom de todas as mudanças entre as equipes de pares e dança? Quantas vezes vou me decepcionar com duplas pelas quais torço se separando? Alguém vai se separar e deixar o fandom fascinado com o drama, como aconteceu com Ilinykh e Katsalapov?

- Papadakis e Cizeron terão rivais a altura? Será alguém que já tem pontuações altas, como Hubbell e Donohue, ou será alguma dupla com uma inflação súbita, como os próprios P/C tiveram? Os times que foram para Gadbois vão realmente evoluir, em questão de técnica e de nota, e dominar as competições?

 - O que acontecerá com os times americanos, canadenses e russos de dança? Teremos as mesmas duplas dominando ou os mais novos terão espaço em grandes competições?

- Quantas das pessoas que estão dando um tempo nessa temporada vão de fato voltar a competir? E elas conseguirão manter suas posições mesmo ficando fora uma temporada?

- A suposição de que a temporada pós-olímpica é mais interessante se revelará verdadeira dessa vez? Ou os programas desinteressantes e o uso de warhorses continuarão dominando? Quais novas modinhas serão criadas? Quais se tornarão menos populares?

-  Haverá alguma mudança em relação à forma de acompanhar as competições? O que a morte da Icenetwork significará? A ISU vai dar algum passo para tornar as competições mais acessíveis ou continuaremos sofrendo até encontrar streamings piratas não tão ruins?

- O Brasil vai continuar unicamente representado pela Isadora Williams em grandes competições? Haverá algum crescimento na popularidade do esporte aqui, com shows ou, sendo muito otimista, alguma competição internacional na América do Sul?

- Algum patinador irá encantar todos de repente? Alguém cairá nas desgraças dos fãs? Meus favoritos de hoje serão meus favoritos em 2022?

- A minha relação com o fandom de patinação mudará nesse período? E o próprio fandom vai continuar igual? Algo, como o filme novo de Yuri! On ice, trará novas ondas de fãs?A aposentadoria de algum patinador muito querido ou algum grande escândalo ou tragédia vai fazer as pessoas pararem de acompanhar o esporte?

- Eu ainda estarei aqui para responder essas perguntas em 2022? E, claro, se estiver aqui e ainda interessada em patinação, será que vou de fato respondê-las? Essa é a única que tem resposta: provavelmente não. 

sábado, 2 de junho de 2018

Os (realmente não tão) últimos filmes que eu vi #22

1- Relatos selvagens (Damián Szifron, 2014)
Esse filme argentino foi muito comentado na época do seu lançamento, sendo até indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro, e eu estava com grandes expectativas. Saí um pouco decepcionada, é claro. O filme apresenta seis histórias, todas com um tema selvagem, violento, e uma boa dose de humor negro. Gostei bastante da história do avião e da protagonizada pelo Ricardo Darín, mas não liguei muito para as outras. É um filme bom, mas não me empolgou. Avaliação: 3,5/5 

2- Ela é demais (Robert Iscove, 1999)
O filme adolescente da vez vem diretamente dos anos 90 e traz alguns dos meus clichês problemáticos favoritos: apostas e makeovers! E toda a forçação de barra decorrente dessas coisas. Eu compreendo bem quem não gosta desse tipo de filme, porque a mensagem transmitida é bem prejudicial. A protagonista já era bem bonitinha antes da mudança e não precisava disso. Mas eu adoro como o cara babaca fica menos babaca com o tempo e como os populares percebem que a Laney é legal de verdade. Além disso, o que dizer das maravilhosas cenas de performances artísticas? Problematizações à parte, Ela é demais me conquistou com os seus clichês e previsibilidades. Avaliação: 3,5/5

3- As aventuras do ursinho Puff (John Lounsbery e Wolfgang Reitherman, 1977)
Não me lembro se já tinha visto esse filme antes; eu associava o ursinho Puff mais aos seus produtos licenciados do que a seus filmes, até que li o livro. Daí, fiquei com vontade de ver (rever?) o filme clássico. O longa tem vários episódios adaptados do primeiro livro, como o caso do balão, mas também apresenta cenas novas para mim, como as com a Toupeira. Achei bonitinha a forma com que a adaptação foi feita, deixando claro que a história vinha de um livro, com imagens brincando com as palavras escritas, por exemplo. A história é bem infantil, o humor é bobo, mas é tão fofinho que não tem como eu não gostar. Avaliação: 3,5/5

4- Precisamos falar sobre o Kevin (Lynne Ramsay, 2011)
Eu adorei o livro, então fiquei ao mesmo tempo curiosa e reticente quanto à sua adaptação para o cinema. Acabei me surpreendendo, porque gostei mais do que esperava. As atuações são ótimas, Kevin e Eva não perdem nem um pouco da sua força na tela. O roteiro conseguiu tirar um pouco do excesso do livro, embora talvez ele tenha exagerado no tom de "essa criança é demoníaca". Gostei do trabalho com as cores e simbolismos, que talvez sejam óbvios demais, mas nem por isso não me impressionaram. Ver o filme me fez lembrar do quanto eu aprecio o livro e ao mesmo tempo consegui admirar o trabalho feito na adaptação, então posso dizer que fiquei bem satisfeita. Avaliação: 4,5/5

5- Sinfonia da necrópole (Juliana Rojas, 2014) 
Tinha medo que  esse filme fosse estranho demais, afinal,  é um musical de humor negro que se passa em um cemitério — o potencial para a bizarrice é muito grande. Mas descobri que os níveis de humor e estranheza são bem aceitáveis. O que me incomoda em musicais é a pretensão e a grandiosidade, e Sinfonia da necrópole apresenta o contrário disso. A crítica social é interessante (eu nunca tinha parado para refletir sobre cemitérios), e o filme é mórbido sem dar medo. Uma boa recomendação de cinema brasileiro. Avaliação: 4/5  

6- Chef (Jon Favreau, 2014)
Estou acostumada a ver o universo da comida e dos food trucks retratado em reality shows, mas não no cinema, por isso fiquei interessada em Chef. O filme é bem família, focando no relacionamento entre pai e filho. Para mim, é açucarado demais, com o final exageradamente feliz. Recomendo para fãs de Compramos um zoológico, acho que a vibe é parecida. E Chef sofre do mal homem-feio-com-mulheres-bonitas. Sério que o protagonista tem como ex-mulher a Sofia Vergara e como peguete a Scarlett Johansson? Avaliação: 3/5

7- 50% (Jonathan Levine, 2011)
Eu queria ver esse filme há séculos, desde que estreou, mas como é um daqueles casos de filme-que-foi-direto-pra-tv, ele ficou esquecido, sempre deixado para trás na minha lista. Até a Netflix me providenciar a oportunidade ideal. 50% é um filme sobre câncer. Mas não exatamente um filme trágico sobre câncer. É uma mistura entre comédia e drama, e consegue equilibrar bem o tom mais sério e o cômico. Ainda assim, não é muito inovador: temos o protagonista, o melhor amigo babaca, a namorada ausente, o novo interesse amoroso em potencial, etc. Tudo está dentro dos moldes, encaixado do jeito certinho para fazer a gente sentir e se emocionar e rir. E acabou sendo menos intenso do que eu esperava, mas imagino que quem tenha passado por uma experiência semelhante com a doença possa ter uma relação completamente diferente com o filme. Avaliação: 3,5/5

8- O lagosta (Yorgos Lanthimos, 2015)
O filme entra naquela categoria de sinopses estranhas: no universo retratado, é proibido ser solteiro. Os solteiros são enviados para um hotel onde devem encontrar um parceiro em até 45 dias. Se não encontrarem, serão transformados em um animal à sua escolha. O protagonista do filme vai ao hotel após seu divórcio e lá vemos as dinâmicas peculiares dos relacionamentos, pautados por características marcantes em comum: quem é míope procura alguém que também use óculos, por exemplo. Também descobrimos que existe um grupo de rebeldes nessa sociedade, e é claro que o protagonista vai se envolver de alguma forma com eles. Explicando assim talvez pareça difícil de entender, mas apesar de não compreendermos as razões por trás dessa sociedade, entendemos a história e é fácil traçar paralelos com o nosso modo de vida. Gostei bastante do filme justamente por ele ser peculiar, mas de uma forma um tanto lógica ao mesmo tempo. Avaliação: 4/5

9- As invasões bárbaras (Denys Arcand, 2003)
Durante seus últimos dias, o protagonista de As invasões bárbaras se reencontra com velhos amigos e com sua família. A história envolve câncer, velhice, relações familiares e também as desilusões  com a modernidade — o grupo de amigos era idealista e de esquerda, mas muita coisa mudou com o tempo. É um enredo interessante, e as relações familiares e as diferenças geracionais são bem desenvolvidas, mas é um filme que faz muito mais sentido para quem viveu os anos 60 do que para quem não tem nem a idade do filho do protagonista. Vale notar que o Canadá, idealizado por tantos, é retratado como lugar de corrupção e com luzes menos favoráveis das que estamos acostumados a ver. Avaliação: 3,5/5

10- Simplesmente acontece (Christian Ditter, 2014) 
Aqui temos o clássico enredo de amigos que poderiam ser mais que amigos, mas a vida simplesmente acontece na forma do timing errado. É um pouco agonizante ver algo que poderia dar certo não acontecendo (como os protagonistas podem ser tão burros!), mas é um filme fofinho. Lily Collins e Sam Claflin estão uma gracinha e, embora seja meio inverossímil, eles não ficaram ridículos interpretando os personagens em um grande período de tempo. Avaliação: 3,5/5

quinta-feira, 17 de maio de 2018

O lar da srta. Peregrine para crianças peculiares, Ransom Riggs

 

Jacob era um garoto normal. De família rica, ele tinha dificuldades em fazer amigos, e a pessoa de quem era mais próximo era seu avô, especialista em histórias de fantasia. Ou pelo menos era isso que o menino queria acreditar, apesar do avô defender a realidade do que contava. Mas um dia tudo mudou, e Jacob nunca mais se veria como normal novamente.

O lar da srta. Peregrine para crianças peculiares estava na minha lista de interesse faz tempo, devido às fotos peculiares e ligeiramente assustadoras que recheiam suas páginas. Vi uma multiplicidade de opiniões a respeito do livro: há quem amou, quem não ligou e quem se decepcionou profundamente. Parece que muita gente esperava algo mais histórico, porque o avô lutou na segunda guerra e o começo é mais pé no chão. Mas não se engane: é uma história típica de garoto-se-acha-normal-e-descobre-mundo-de-fantasia. Tão típica que fiquei pensando que já tinha lido esse livro antes, só que com outras roupagens. Não é que seja uma cópia, mas simplesmente li livros demais desse tipo. E se quando era mais nova era exatamente o que procurava, hoje já acho o modelo cansativo.

O começo é cativante, gostei da relação do Jacob com a família, cheia de problemas mas não caricata e puramente odiosa. E o avô é um personagem interessante. Quando Jacob vai para a ilha onde está o tal lar de crianças peculiares, continuamos com o clima misterioso e sombrio do início, mas logo a fantasia entra e tira o espaço de uma realidade que poderia ter sido mais explorada.

Temos então a parte de descobertas da história, que logo dá espaço para as cenas de ação e aventura. Conhecemos as crianças peculiares e seus inimigos, caindo no convencional. Mistérios são revelados e outros surgem, criando espaço para novos livros com mais ação e suspense.

É aí que entra a diferença da Marília mais nova e a de hoje. A mais nova compraria o resto da coleção e o devoraria avidamente, até porque é de fato uma história facilmente devorável. A de hoje tem preguiça e sabe que vai esquecer detalhes do enredo dois segundos depois, então não adianta manter a ilusão de que vai ler o resto. Não é você, livro, é a Marília do presente e o excesso de histórias parecidas que ela leu.

Por ser uma história interessante do ponto de vista visual, no entanto, com cenários decadentes e sombrios, fiquei bem curiosa para ver o filme e descobrir como Tim Burton deu vida às fotografias peculiares.