quinta-feira, 27 de março de 2014

Sua resposta vale um bilhão, Vikas Swarup

Sua resposta vale um bilhão

Alguns dirão que a culpa foi minha. Que eu não tinha nada que me manter num programa de perguntas e respostas. Vão me apontar o dedo e lembrar o que dizem os velhos de Dharavi: nunca se deve cruzar a linha que separa os ricos dos pobres. Ora, onde já se viu um garçom sem um tostão participar de um teste de inteligência? O cérebro não é um dos órgãos que temos permissão de utilizar. Nós só devemos usar as mãos e as pernas.

                                                                                  (Sua resposta vale um bilhão, p. 10)

Ram Mohammad Thomas acabou de ganhar um bilhão de rupias em uma programa de perguntas e respostas na televisão. Ele respondeu corretamente todas as perguntas, o que deixa os produtores do programa muito bravos, pois eles na verdade não podiam pagar essa quantia. E ninguém achou que um simples garçom de dezoito anos pudesse acertar as respostas. Então ele é preso por suspeita de fraude e tem que contar a história da sua vida para mostrar como acertou cada resposta, desde quando o abandonam em uma igreja e ele é criado por um tempo pelo padre até os acontecimentos que o fizeram participar do programa.

Eu assisti Quem quer ser um milionário? quando ele lançou. Achei legal, prendeu a atenção, mas nada muito marcante. Fiquei com vontade de ler o livro, porque acho interessante ler livros de países de culturas bem diferentes da nossa. Estava com um pouco de medo de eu ir lembrando bastante do filme enquanto lia e que assim a leitura perdesse a graça, mas isso não aconteceu por dois motivos: o primeiro é que minha memória é ruim e o segundo é que os dois são muito diferentes. Tem alguns personagens em comum, mas mesmo esses têm personalidades diferentes, e alguns aspectos da história são parecidos como o fato de ele trabalhar em um momento no Taj Mahal ou de ele e Salim serem treinados para pedirem esmola. Mas o livro também tem muita coisa que não aparece no livro, e vice-versa. No livro, por exemplo, Ram passa por muitos empregos diferentes e conhece muito mais gente  tanto as violentas e corruptas quanto as vítimas dessas pessoas.

A leitura foi interessante. É legal ver algumas coisas da cultura indiana que já tinha visto em outros livros, embora eu tenha ficado me questionando até que ponto essa visão da Índia é realista, porque a história de Ram é tão especial e cheia de coincidências que a gente não sabe se a parte da vida dele antes do programa é muito exagerada ou não. E também não entendi bem qual a moral que é para tirar do livro. Ele termina tão bem que parece que quase contradiz as críticas que faz antes. Algo do tipo “você vai se foder durante a vida inteira, mas no final se você acreditar em si mesmo e for um cara do bem vai dar tudo certo, então não se preocupe!”. É uma história muito pessimista para ter um final tão otimista e praticamente tudo se resolver. Não achei coerente, ou melhor, até achei, já sabia que seria assim, a premissa do livro é meio essa. Mas achei brega.

Eu diria que o que eu mais gostei no livro é o seu formato. Os trechos da vida de Ram são contados e depois vem a pergunta no programa relacionada a eles. Desse jeito, vamos ligando os pontos da vida de Ram lentamente, vendo as coisas de forma não cronológica, e eu sempre ficava me perguntando qual seria a pergunta feita, que coisa do trecho que ele contou teria relação com a pergunta.

Para concluir, não acho que seja um livro para qualquer um. Não é uma leitura leve, por ter violências de vários tipos, mas também não é uma leitura de grande densidade psicológica ou pesada, porque a gente não chega a se envolver tanto assim com as desgraças que acontecem, já que logo vem outra em seguida e você esquece da anterior. Mas vale a pena se você gostou do filme ou se se interessou pela história.

 Avaliação final: 3,5/5

domingo, 23 de março de 2014

As bruxas, Roald Dahl

As bruxas

Ah, se pelo menos houvesse um jeito infalível de perceber se uma mulher é ou não é bruxa! Aí então a gente pegaria todas as bruxas e as passaria pelo moedor de carne. Infelizmente esse jeito não existe. Mas existem alguns pequenos sinais que vocês podem tentar descobrir, pequenos hábitos e gestos que todas as bruxas têm em comum. Se vocês os conhecerem, e não se esquecerem de nenhum, talvez consigam escapar de ser trucidados antes de se tornarem adultos.

                                                                                                               (As bruxas, p. 4)

Eu gostava muito dos livros do Roald Dahl quando menor. Li praticamente todos que tinham em português. Diferente de muita gente, os filmes de Matilda ou de As bruxas não foram tão presentes na minha infância e eu não tenho carinho nenhum por eles. Mas tinha pelos livros. Até que reli Matilda e não achei grande coisa. Então decidi reler As bruxas para ver se eu estava desencantada com toda a obra infantil do Dahl continuo gostando bastante dos contos adultos ou se Matilda, entre as obras mais famosas, era uma exceção.

As bruxas é sobre um menino órfão que mora com a avó, especialista em bruxas. Eles vão passar as férias em um hotel na Inglaterra e acabam trombando com uma reunião de bruxas, que estão fazendo um plano para acabar com todas as crianças. O menino e a avó têm que derrotá-las, mas como fazer isso?

O livro é contado pelo menino e por isso tem uma visão bem infantil do mundo. Ele diz que tomar banho ou ir à escola é chato, por exemplo. Essas opiniões são o que fazem o Roald Dahl ter um diferencial, na minha opinião. As bruxas não é um livro educativo nos modos tradicionais. Claro que ensina alguns valores, mas não tem vergonha em quebrar regras sociais ou em botar alguns adultos como vilões. Isso é legal, mas me incomodou em Matilda, por exemplo, como tudo é sempre muito maniqueísta.

A história de As bruxas é bem simples e divertida e o livro prende a atenção. Não é um livro que me marcaria se eu não tivesse lido antes, e não é o meu favorito do Roald Dahl, mas vale a pena para quem gosta de literatura infanto-juvenil.

Avaliação final: 3,5/5

quinta-feira, 13 de março de 2014

Peixe grande, Daniel Wallace

Peixe grande

Olhei para aquele velho, o meu velho com seus pés brancos mergulhados naquele riacho de águas cristalinas, naquele momento tão próximo ao fim de sua vida, e pensei nele, de repente, simplesmente, como um menino, uma criança, um jovem, com a vida toda a sua frente, assim como eu tinha a minha à minha frente. Eu nunca tinha feito isso antes. E aquelas imagens — o hoje e o ontem de meu pai — convergiram, e, naquele momento, ele se transformou numa criatura estranha, selvagem, ao mesmo tempo jovem e velha, moribunda e recém-nascida.

Meu pai se tornou um mito.

                                                                                                         (Peixe grande, p. 10)

Não sou do tipo de pessoa que acha que o livro sempre é melhor que o filme ou coisa do tipo. É fato que raramente prefiro o filme quando leio o livro antes, mas é bem comum que eu goste mais do filme quando vejo o filme antes, porque já vejo as coisas no universo do filme e sobra pouco espaço para imaginação funcionar. Com Peixe grande eu não sei dizer qual eu prefiro. Mas gostei muito dos dois.

Peixe grande conta a história (ou as histórias?) de Edward Bloom, um homem extraordinário. Amado por todos, não havia nada que ele não conseguisse fazer. É isso que ele conta ao filho, William. Mas William acha que não conhece bem o pai, e quando este está prestes a morrer, ele sente que precisa conhecê-lo de verdade, e assim percebe que as histórias são uma maneira de entendê-lo.

O livro reúne as histórias de Edward, contadas pelo filho em ordem cronológica, com algumas pausas para relatar várias versões do presente, a última conversa entre pai e filho. As histórias são curtas, divertidas e fáceis de ler, mas tem também muita coisa por baixo delas, e a relação entre pai e filho é interessante. É bonito ver as mudanças que William vai sofrendo ao entender melhor o seu pai, e ele não chega a endeusá-lo, o que seria problemático. Ele nos deixa livres para pensarmos o que quisermos de Edward. Eu não lembro tão bem do filme, mas tenho a impressão que o William era mais agressivo do que no livro, em que ele se sente mais frustrado do que bravo com o pai. Além disso, a vida do William parece ser menos explorada no livro, a gente sabe pouquíssimo dele. Este foco no pai está até no subtítulo original do livro: a novel of mythic proportions, que em português virou uma fábula do amor entre pai e filho. Meio brega, mas compreensível.

O fato de eu ter visto o filme me fez gostar mais do livro, porque reencontrar os personagens que eu já conhecia deu um tom de pertencer a história, de rever velhos amigos, algo até nostálgico.

Enfim, Peixe grande é um belo livro que mostra o poder das histórias, e traz reflexões interessantes sobre a construção da memória e também sobre relações entre pai e filho, e vida e morte. Recomendo o livro e o filme.

Avaliação final: 4/5

terça-feira, 11 de março de 2014

Tristão e Isolda

Tristão e Isolda

“Isolda, só vós e o amor me perturbaram e me fizeram perder o senso. Deixei a estrada e eis-me de tal modo perdido que jamais a voltarei a encontrar. Tudo o que os meus olhos veem parece-me sem preço. Em todo o mundo, nada é querido ao meu coração excetuando vós.”

(Tristão e Isolda, p. 49)

Li o livro para minha aula de literatura portuguesa, para estudar novelas de cavalaria. A minha edição não tem nome do autor(!), só da tradutora, Maria do Anjo Braamcamp Figueiredo.

Tristão e Isolda conta uma história de amor proibido. Eles se apaixonam por terem bebido uma poção do amor, mas Isolda tem que se casar com o rei Marcos, e por isso ela e Tristão vivem uma série de encontros apaixonados e escondidos, de suspeitas de traição e respostas espertas para as suspeitas de traição.

O narrador do livro mostra claramente estar do lado dos amantes apaixonados, pois eles não têm culpa de terem bebido a poção. Eu concordo, mas o casal não me inspira muita compaixão. Eles são muito fortes, sagazes, cheios de virtude, exemplos para todos. Completamente tediosos. E melosos. E por isso a leitura foi bem entediante para mim. Não esperava uma história muito complexa, porque é uma lenda antiga e tal, e reconheço a sua importância, mas não é meu tipo de livro.

Avaliação: 2/5

quinta-feira, 6 de março de 2014

Os últimos filmes que eu vi #3

1- Blue Jasmine (Woody Allen, 2013)

Blue JasmineNão simpatizo tanto com os filmes mais recentes do Woody Allen, do tipo de ir ao cinema assisti-los. Mas este foi muito elogiado e minha irmã queria ver. É um filme bom, as atuações são muito boas, mas não achei a história muito original (achei que a mensagem ficou clara demais) e agora, três meses depois de tê-lo visto, não sei mais o que comentar. A minha avalição vai mais pela qualidade do filme do que pelo quanto eu me envolvi. Avaliação: 4/5

2- O que traz boas novas (Philippe Falardeau, 2011)

O que traz boas novas De vez em quando aparecem uns filmes mais cults, que estreiam em poucas salas de cinema e que por alguma crítica no jornal me chamam a atenção. Este, canadense, é sobre um imigrante argelino que substitui uma professora que se suicidou na escola. Ao mesmo tempo em que vemos o professor trabalhando e sua relação com os alunos e os colegas do trabalho, descobrimos aos poucos algumas coisas sobre o passado dele. Costumo gostar de filmes de professor, e gostei deste também. Acho interessante ver as dinâmicas da sala de aula, como temas polêmicos são tratados e as diferenças culturais tanto com os alunos do filme quanto em comparação com o Brasil. Em alguns aspectos, o filme me lembrou Entre os muros da escola, embora o foco de O que traz boas novas não seja exatamente as relações escolares, e sim a vida do professor. Avaliação: 4/5

3- Pais e filhos (Hirokazu Koreeda, 2013)

Pais e filhos  Li uma crítica no jornal elogiando muito o filme (como dá para perceber, sou bem influenciável), fiquei curiosa com o enredo sobre filhos trocados na maternidade e decidi assistir.

É um filme sério, mas tem seus momentos engraçados, especialmente quando as crianças estão em cena. O filme aborda várias questões da vida moderna no Japão, que me interessam muito: a pressão nos filhos desde cedo, as diferenças de classe, a família patriarcal, a honra… No geral, não sei bem o que criticar no filme, talvez algumas coisas que não achei claras, ou que eu não tinha certeza se deveria interpretar como crítica ou apenas como observação… E embora eu tenha visto gente dizer que o filme não apela para o sentimentalismo (e isso seria um mérito, segundo eles, tratando desse tema), eu discordo e só vou dizer que minha mãe chorou muito durante todo o filme. Mas não acho isso ruim, porque significa que a gente se conectou com (alguns) personagens. E assim como eu só senti raiva da Jasmine em Blue Jasmine, eu não consegui não ficar muito brava com o pai rico de Pais e filhos. Avaliação: 4/5

4- Gatinhas e gatões (John Hughes, 1984)

Gatinhas e gatões Não costumo assistir filmes pela internet, mas estava com vontade e tempo de ver algo e não tinha nada de bom na TV. Optei por usar o Telecine Play, porque não estava a fim de fazer muita pesquisa para encontrar algum filme que eu estivesse com vontade de ver. Então, depois de muitas dúvidas entre filmes que eu queria muito ver mas eram muito compridos ou filmes mais leves e curtos, acabei escolhendo a segunda opção, e ficando com este filme do John Hughes que tem um título horrível em português. E acertei na minha escolha, o filme é leve, engraçado e envolvente. Algumas coisas me incomodaram, como piadas racistas ou forçadas e uma apologia a estupro, mas acho que faz parte do que as pessoas pensavam na época — e, infelizmente, muitas ainda pensam hoje. Enfim, é um filme bem Sessão da Tarde, e recomendo para quem quer se distrair. Avaliação: 3,5/5

5- O lado bom da vida (David O. Russell, 2012)

O lado bom da vida Assisti esse filme porque todo mundo estava discutindo sobre o David O. Russell e a Jennifer Lawrence, se eles merecem todas as indicações para prêmios e tal. E, como a maioria das pessoas, achei O lado bom da vida superestimado. É um filme envolvente, engraçado e trata de um assunto sério, mas é tããão clichê! É uma comédia romântica com boas atuações (mas não ótimas) e um tema sério. Mas juro que eu acho muitas comédias românticas ignoradas pela crítica melhores do que essa. Avaliação: 3,5/5